25 de junho de 2014

MISSÃO INTEGRAL - INTRODUÇÃO


Introdução
Em 1974, em Lausanne, Suíça, ocorreu o mais importante evento eclesiástico do século XX: o Primeiro Congresso Internacional de Evangelização mundial. A igreja propunha reafirmar sua vocação e visualizar os desafios da evangelização de todo o mundo. As teses dos oradores convergiram para o tema da Missão Integral.
O Congresso de Lausanne, na Suíça, produziu nos cristãos um impacto de tão grandes proporções que os participantes, dentre as mais renomadas denominações ali representadas, firmaram um pacto, onde ficou descrita a visão missionária da igreja no mundo atual. É neste contexto histórico que a concepção de Missão Integral torna-se algo bem maior que um simples conceito teológico.
A Igreja assumiu uma postura e uma imagem perante o mundo de agente transformador, para exercer sua influência no contexto em que atua. O conceito de evangelização estende-se para além da tarefa de ganhar almas; constitui-se numa estratégia divina de salvação integral que culmina na transformação de vidas que se submetam ao senhorio de Jesus Cristo e à soberania de Deus, para o exercício da missão cristã no mundo.
A Missão Integral da Igreja, portanto, é reconhecida como a tarefa de levar o evangelho todo a todos os homens (de todas as etnias) e ao homem todo. A igreja precisa reconhecer que tem no mundo uma responsabilidade de caráter social que, no exercício de sua missão, jamais deve estar divorciada da evangelização. Outrossim, a igreja deve reconhecer que tem uma função política através da qual educa os cidadãos da pátria celestial a exercerem sua cidadania terreal no uso responsável de sua liberdade, defendendo o direito e a justiça, prestando assistência aos desamparados e contribuindo para o estabelecimento da ordem social.
Não se concebe mais a idéia de evangelização ou de missão sem levar em conta o homem como um todo e o contexto em que ele está inserido. René Padilla, um dos oradores do congresso, considerou que “o contexto no qual se evangeliza é tão importante quanto qualquer outra coisa, ao se decidir acerca do significado do evangelho para aquele mesmo contexto”.[1] Isto significa que a evangelização não pode estar alienada da realidade. Por esta razão, a Missão Integral da Igreja está alicerçada sobre três pilares:
a)  O compromisso com todo o desígnio de Deus;
b)  O alcance de cada ser humano em sua totalidade;
c)  A transformação social do contexto em que a pessoa vive.

Missão Integral implica na contextualização do evangelho. Isto quer dizer que a mensagem proclamada deve atender às necessidades, às inquietações e aspirações prementes da pessoa humana, em todas as áreas de sua vida e do contexto em que vive. A concepção de Missão Integral deve também reafirmar as seguintes convicções:
a)  O compromisso com a autoridade das Escrituras;
b) Sem Cristo, todo ser humano está perdido e sem esperança de salvação;
c)  Só há salvação em Jesus Cristo;
d)  O testemunho cristão engloba a proclamação e as obras.

“A fé sem obras é morta. A fonte da salvação é a graça. O terreno é a expiação. O meio é a fé. A evidência são as obras” disse Billy Graham no referido Congresso de Lausanne.[2] Evangelização não pode estar dissociada da responsabilidade social. A ação social é a aliada inseparável da evangelização. Mas aqui há o risco de se cometer três erros, como disse Billy Graham: “O primeiro é negar que tenhamos qualquer responsabilidade social como cristãos [...] O segundo erro é permitir que a preocupação de ordem social absorva todo o nosso tempo, tornando-se nossa única missão [...] O terceiro erro consiste na identificação do Evangelho com algum programa político ou cultural particular”. [3]


1.  A Identidade Missionária da Igreja (1Pe 2.9)
O conceito de missão eclesiástica deriva do atributo do apostolado da igreja. De acordo com 1Pe 2.9, a igreja tem uma identidade e uma vocação missionária que podem ser expressas nos seguintes termos:

1.1.    A igreja é a GERAÇÃO dos ELEITOS de Deus
“Vós sois a raça eleita” é a declaração de Pedro que identifica a igreja como uma comunidade de regenerados. Ela é a segunda raça, a nova criação (2Co 5.17), a nova humanidade (Ef 4.24; Cl 3.10), onde estão congregados todos os filhos de Deus, os nascidos de Deus pela ação do Espírito. Todos estes regenerados estão eleitos e tal eleição implica em vocação. Deus os gerou e os elegeu para um serviço sagrado: a missão.

1.2.    A igreja é a comunidade SACERDOTAL que promove o reino
“O sacerdócio real”, que literalmente significa o reino constituído por aqueles que exercem o ofício de sacerdote, denota o exercício de um duplo ofício: o sacerdotal, pelo qual os santos na igreja exercem, sob a liderança de Cristo como Sumo Sacerdote (Hb 4.14), a mediação entre o mundo e Deus; e o real, pelo qual a igreja se constitui em agência do reino dos céus no mundo das nações.
“Os dois ofícios de rei e sacerdote eram zelosamente conservados um separado do outro em Israel (cfr. 2Cr 26.16-21), mas em Cristo eles dois se combinam. Cristo é sacerdote entronizado rei (Zc 6.13) e todos quantos O seguem são reis e sacerdotes para Deus. Tudo quanto o sacerdote era nos tempos do Velho Testamento, em sua relação com Deus e os homens, o cristão deve ser na sua coletividade e na sua vida individual".[4]
A igreja é uma comunidade de sacerdotes que reconhece Jesus como seu Sumo Sacerdote (Hb 4.14; 5.9-10; 6.20; 9.11). Cristo exerce sua mediação entre Deus e o homem (1Tm 2.5) por meio da igreja como a agência executora de sua vontade soberana no mundo. Sua representatividade é definida pela forma como os regenerados são designados como “embaixadores de Cristo” (2Co 5.20) e, ao mesmo tempo, incumbidos da missão de reconciliar o mundo com Deus. Neste sentido, a igreja é instância da autoridade divina no mundo.

1.3.    A igreja é a comunidade dos SANTOS constituídos em nação
A expressão “nação santa” (eynov agion) denota a idéia de que os santos foram constituídos em nova nação. Isto significa que Deus, a semelhança do que fez com Israel na aliança do Antigo Testamento (cf. Ex 19.5), constituiu a igreja, a qual é o novo povo santo, em uma nova nação inserida no mundo das nações. O termo também conota a nova cidadania dos santos, cuja “pátria está nos céus” (Fp 3.20; Ef 2.19; 1Pe 2.11).
A expressão “povo adquirido” (laov eiv peripoihsin = povo de possessão) denota a idéia de resgate, portanto, a igreja é o povo resgatado, isto é, um preço foi pago pela sua liberdade (1Co 6.20; 7.23). Assim sendo, a igreja se tornou o “povo de propriedade exclusiva de Deus” (1Pe 2.9), que uma vez liberto do cativeiro do pecado e do “império das trevas” foi transportado para “o reino do Filho amado de Deus” (Cl 1.13).
A implicação disso é que todos os santos são constituídos em cidadãos do reino divino, o qual foi estabelecido por Cristo aqui na terra (cfr. Ap 5.9-10). Por isso, os cristãos vivem e agem no mundo segundo os valores do reino celeste. São agentes divinos que exercem sua nova cidadania através da missão de promover, xpandir e consolidar o reino de Deus entre os homens.
Como súditos do reino e “embaixadores de Cristo” no mundo das nações (2Co 5.20), os santos são porta-vozes oficiais de Deus e de Cristo no mundo, incumbidos da missão de reconciliar o mundo com Deus, proclamando “as grandezas daquele que os chamou das trevas para sua maravilhosa luz” (1Pe 2.9).

2.  Conceito de Missão
A identidade missionária da igreja é designada por sua natureza apostólica. Como disse Johannes B. Blauw, “não existe nenhuma outra igreja senão a igreja enviada ao mundo e não há outra missão a não ser a da Igreja de Cristo”.[5]
A apostolicidade é o mais relevante atributo missiológico da igreja. Dele deriva o conceito de missão expresso por Warneck: “Por missão cristã entendemos a atividade conjunta da cristandade, buscando a implantação e a organização da igreja cristã entre os não-cristãos. Tal atividade denomina-se missão, pois baseia-se na força do envio do chefe da igreja cristã, é realizada por emissários (apóstolos, missionários) e seu objetivo será atingido assim que não seja mais necessário outro envio”.[6]
Para John Stott,
Missão quer dizer atividade divina que emerge da própria natureza de Deus. Ora, o Deus vivo da Bíblia é um Deus que envia; eis aí, portanto, o significado da palavra. Ele enviou seus profetas a Israel, e enviou o seu Filho ao mundo. Este, por sua vez, enviou os apóstolos, os setenta e a igreja. Enviou também o Espírito Santo à igreja e hoje o envia aos nossos corações. Assim, a missão da igreja resulta da própria missão de Deus, e nela tem de ser modelada. ‘Assim como o Pai me enviou’, disse Jesus, ‘também vos envio a vós’ (Jo 20.21; cf. 17.18).

A continuar...





[1] René PADILLA. Missão integral, pp. 7, 8.
[2] Billy GRAHAM. A missão da igreja no mundo de hoje, p. 21.
[3] Billy GRAHAM. Ibdem, pp. 22, 23.
[4] F. Davidson. O novo comentário da bíblia, p. 1408.
[5] Johannes B. BLAUW. A natureza missionária da igreja, p. 122.
[6] Gustavo WARNECK, citado por Karl Muller em sua obra Teologia da Missão, 1995, p. 39.

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