23 de maio de 2014

ADMINISTRAÇÃO ECLESIÁSTICA - CAPÍTULO I

Administração na Igreja - Os desafios de hoje!



ADMINISTRAÇÃO ECLESIÁSTICA

Pr. José Vidigal Queirós





CAPÍTULO I

A FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICA DA ADMINISTRAÇÃO
(Myron Rush, Administração: uma abordagem bíblica. Editora Betânia, 2005)


Introdução
A necessidade de organizar e tornar eficaz o funcionamento de uma igreja exige a capacitação de pastores na área de gestão eclesiástica. Uma vez que os pastores e líderes eclesiásticos são formados em instituições evangélicas designadas para a educação teológica, estes carecem de preparo para administrar ou liderar a igreja com todos os seus departamentos, organizações missionárias e grupos específicos de ministérios especiais. O preparo de gestores de igrejas exige, portanto, a construção de uma visão bíblico-teológica da administração que norteie o processo de formação de gestores eclesiásticos.

1.       O modelo de Jesus
Administrar, segundo a concepção da maioria dos professores universitários e consultores administrativos, consiste na tarefa de “realizar o trabalho por meio de outros”. [1] Tal conceito é essencialmente empresarial e deriva do capitalismo, onde pessoas são vistas como instrumentos de produção de riquezas. Esta concepção produz uma relação de dominação que fere e viola os valores cristãos, conforme o exemplo abaixo.
“Aproximou-se dele, então, a mãe dos filhos de Zebedeu, com seus filhos, ajoelhando-se e fazendo-lhe um pedido. Perguntou-lhe Jesus: Que queres? Ela lhe respondeu: Concede que estes meus dois filhos se sentem, um à tua direita e outro à tua esquerda, no teu reino. Jesus, porém, replicou: Não sabeis o que pedis; podeis beber o cálice que eu estou para beber? Responderam-lhe: Podemos. Então lhes disse: O meu cálice certamente haveis de beber; mas o sentar-se à minha direita e à minha esquerda, não me pertence concedê-lo; mas isso é para aqueles para quem está preparado por meu Pai. E ouvindo isso os dez, indignaram-se contra os dois irmãos. Jesus, pois, chamou-os para junto de si e lhes disse: Sabeis que os governadores dos gentios os dominam, e os seus grandes exercem autoridades sobre eles. Não será assim entre vós; antes, qualquer que entre vós quiser tornar-se grande, será esse o que vos sirva; e qualquer que entre vós quiser ser o primeiro, será vosso servo; assim como o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em resgate de muitos” (Mt 20.20-28).
O modelo de Jesus contradiz o padrão de administração mundana. Ao contrário do sistema secular que estabelece uma relação de domínio e subordinação entre chefes e subalternos, Jesus propõe um modelo no qual o administrador é um líder que encarna o perfil de servo daqueles que lhe estão submissos. Ele não anulou o princípio da hierarquia e da autoridade, mas estabeleceu uma relação na qual os liderados são tratados com dignidade e considerados em elevada estima por parte de quem os administra. O modelo mundano é opressivo, destituído de cordialidade, gera insatisfação e reduz a produtividade. Como, então, poderíamos conceituar administração, segundo o padrão bíblico? “Administrar significa suprir as necessidades dos subordinados, enquanto eles trabalham no cumprimento de suas tarefas”, opina Rush.[2]
Ninguém contesta que Jesus foi o líder por excelência. O apóstolo Paulo, em Fp 2.5-7, descreve clara e enfaticamente a pessoa de Jesus como modelo a ser seguido por todos os cristãos e isto inclui os pastores e líderes: “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana...”.
Por ser uma instituição que busca cumprir os propósitos estabelecidos por Deus, a igreja precisa imprescindivelmente adotar os princípios da administração propostos nas Sagradas Escrituras, para que possa compatibilizar suas ações à natureza e desígnios para os quais ela foi instituída.

2.       Elementos fundamentais que garantem o sucesso na administração
A identificação dos elementos-chave que garantem o sucesso de uma instituição pode ser encontrada nas Sagradas Escrituras. Partindo do estudo de um caso registrado na Bíblia, a construção da Torre de Babel, pode-se encontrar quatro elementos necessários ao progresso de uma instituição bem sucedida. A passagem bíblica que narra este fato encontra-se em Gn 11.1-9. Examinando tal passagem, Rush[3] alistou estes quatro elementos:
a)       O compromisso de trabalhar em torno de um mesmo objetivo (v. 3, 4);
b)       Unidade entre as pessoas envolvidas (v. 6);
c)       Um sistema eficaz de comunicação (vv. 1, 6);
d)       Agir conforme a vontade de Deus (os versículos 7 a 9 mostram que eles não o estavam fazendo).
O compromisso assumido por parte de um grupo de pessoas envolvidas com um empreendimento, para trabalharem focados num mesmo objetivo, estando elas unidas por esse compromisso e mantendo um sistema de comunicação eficaz entre si, suscitará um potencial ilimitado: “Eis que o povo é um, e todos têm a mesma linguagem. Isto é apenas o começo; agora não haverá restrição para tudo que intentam fazer(v. 6).
Na visão divina, pessoas podem realizar qualquer coisa, e nada as impedirá de realiza-la, quando trabalham unidas em torno de um objetivo comum e dispõem de um sistema de comunicação eficaz. Somente Deus pôde barrar a construção da Torre de Babel; e, se ele não o fizesse, nada os impediria de obter sucesso na realização do projeto que decidiram executar. Ao desarticular o sistema de comunicação através da confusão das línguas, Deus obteve, em consequência disso, a quebra da unidade do grupo e do comprometimento individual com o projeto; o resultado final foi o fracasso total.

2.1.    A atividade administrativa
Myron Rush resume a atividade administrativa em duas categorias básicas: a administração de “coisas” e a administração de “ideias”.[4] Coisas são concretas, visíveis e palpáveis (prédios, as instalações, os equipamentos e os suprimentos), portanto, são mais fáceis de serem administradas; enquanto que as ideias são abstratas, intangíveis. Coisas podem ser controladas e organizadas num inventário e entrega-las sob a responsabilidade de uma pessoa.
Quando se trata de ideias, tudo é diferente. Elas são difíceis de serem avaliadas, até mesmo de serem explicitadas. Podem até existir sem o conhecimento de quem administra. A maioria das pessoas incumbidas da administração dispende quase todo o seu tempo gerindo coisas o que as levam ignorar as ideias. Mas deve-se levar em conta que são as ideias que dão origem às coisas. Nesta linha de raciocínio, Rush comenta:
Tudo que o ser humano constrói – e construiu – surgiu primeiramente na forma de uma ideia que alguém teve. E as coisas que existirão amanhã serão o resultado das ideias de hoje. Portanto o líder ou administrador que deseje progredir, ou que queira que sua instituição continue ativa no futuro, tem de dar prioridade máxima à administração das ideais. Afinal o futuro da instituição depende de como ela irá administrar as ideias que as pessoas estão tendo no presente. [5]

O erro cometido por grande parte dos administradores consiste no fato de que eles consideram seus funcionários como meros objetos usados para o trabalho e não como pessoas. Administradores que assim procedem acreditam que somente eles são capazes de ter ideias, ignorando o fato de que o patrimônio mais valioso de uma instituição é constituído das pessoas que a compõem. Tais administradores concentram sua atenção em orçamentos, prédios e equipamentos em detrimento das pessoas que cuidam de tudo isso. Ignoram o fato de que elas também são dotadas de inteligência e são criativas.
Uma vez que “administração consiste em gerenciar, controlar e dirigir”, diz Eliel Gaby, “a responsabilidade do administrador resume-se na tarefa de estabelecer objetivos organizacionais e desenvolver estratégias necessárias para alcança-las”.[6]Isto requer do administrador o desempenho de algumas funções primordiais:[7]

a)  Prevenção – diz respeito à capacidade de visualizar os acontecimentos futuros e traçar programas de ação (planejamento).
b)      Organização – consiste na composição da estrutura funcional da organização responsável pela viabilização das atividades planejadas.
c)   Comando – ato de dirigir e orientar. Na igreja, o comando está com o pastor. Sendo uma organização espiritual, a igreja reconhece e se submete à autoridade do pastor, em virtude de sua vocação divina.
d)    Coordenação –consiste no ato de promover harmonia entre todos os esforços. Embora o pastor esteja no comando geral da igreja, esta é uma tarefa que exige profissionalismo e somente um gestor habilitado deve exercer.
e)    Controle – diz respeito ao uso de mecanismos eficientes para monitoramento das ações, durante a execução do plano.

2.2.    A criatividade humana
Conceituando criatividade, Rush opina que ela consiste na “capacidade de fazer algo novo ou dar uma nova forma àquilo que já existe”. [8] Deus, por ser o Criador de todas as coisas, criou o homem à sua imagem e semelhança e, consequentemente, ele se tornou um ser criativo. O ser humano é racional e, portanto, dotado da capacidade inventiva. Por esta razão, “a mente humana é o patrimônio mais valioso de uma instituição”. [9] Com base nisto, pode-se afirmar que criatividade não é um talento ou atributo que somente alguns privilegiados possuem.
Rush opina que “ninguém precisa fazer um curso de capacitação para se tornar criativo” e acrescenta: “a criatividade é o resultado natural do processo do pensamento humano. Seu desenvolvimento dentro de uma instituição se restringe ao nível de liberdade que os patrões e administradores conferem aos funcionários”. [10] Uma boa aplicação deste conceito foi feita por Jesus na parábola dos talentos, onde ele destaca a importância da produtividade. Os produtivos foram recompensados, enquanto o improdutivo foi punido.
Nesta parábola são destacados dois princípios bíblicos de administração e liderança. O primeiro diz respeito ao uso individual dos talentos e da criatividade que Deus conferiu a cada ser humano. O segundo é o princípio do reconhecimento e retribuição pelo desempenho individual de sua criatividade. Significa dizer que o administrador cristão deve incentivar as pessoas com quem trabalha a fazer uso de sua criatividade para melhorar a produtividade tanto individual quanto o da instituição a que serve. A tais pessoas o líder deve dar o devido crédito e reconhecimento. Isso as leva sentir-se não somente valorizadas, mas principalmente necessárias.

3.       O ambiente de trabalho produtivo
Considerando que o ambiente de trabalho exerce influência direta na produtividade, a criação de tal ambiente é tarefa do líder ou administrador. Segundo Rush, as condições desse ambiente que o administrador haverá de criar dependem:
a)       Da forma como ele reage diante das necessidades da equipe;
b)       Da sua atitude com relação ao pessoal e ao trabalho;
c)       Da maneira como usa a autoridade;
d)       Do modo como reage em face dos erros e fracassos da equipe;
e)       Da sua disposição de reconhecer o mérito da equipe.

Para que o líder aproveite o potencial criativo do pessoal sob seu comando, ele precisa aplicar a filosofia bíblica de administração. Portanto, ele precisa “estabelecer um relacionamento de confiança com a equipe, delegar poderes de decisão a cada membro do grupo, transformar os fracassos e erros em experiências positivas que gerem aprendizado, demonstrar sempre, tanto à equipe como um todo quanto aos membros, individualmente, o devido reconhecimento pelas suas realizações”. [11]

4.       O espírito de equipe
Em palestra proferida aos pastores da Convenção Batista Maranhense, James Paul Thorp propôs que a importância do trabalho em equipe reside no fato de que, em um grupo organizado e coeso, as ideias individuais se completam, há crescimento nos resultados, a equipe supera as deficiências individuais e possibilita o sucesso. Neste sentido, o trabalho em equipe deve estar focalizado no grupo e não em seu líder ou componentes, individualmente.
Equipes funcionam no princípio de sinergia (sinergia = o todo é maior do que a soma das partes individuais).A equipe aproveita as diferenças individuais de tal forma que as limitações de uns são superadas pelas habilidades de outros. Os resultados sempre serão melhores e maiores que os resultados do trabalho individual. Para que o trabalho em equipe seja eficaz, James declarou que são necessários os seguintes elementos:
a)       Aptidão e competência funcional por parte do líder.
b)       Definição prévia dos alvos da equipe.
c)       Definição do papel individual dos membros da equipe.
d)       Um processo de avaliação da conduta dos que formam a equipe.
e)       Os níveis de relacionamento entre os componentes da equipe.
f)        Os valores que a equipe deve adotar.
g)       Disciplina para que haja preservação da ordem.


4.1.    Necessidades pessoais trazidas para a equipe
Segundo Rush, “cada membro da equipe chega a ela trazendo uma série de necessidades pessoais exclusivas”.[12] 
O progresso tecnológico acelerado gerou uma crise de identidade. Os computadores e outros equipamentos eletrônicos são capazes de realizar com mais rapidez o trabalho que muitas pessoas executavam no passado e, desta forma, tornaram-se mais valorizados que as pessoas. O trabalho em equipe gera interação e os componentes se sentem úteis, mas suas necessidades pessoais precisam ser supridas pelo administradorcomo meio de motiva-las a uma melhor produtividade.

4.2.    O fator mais importante para a formação de equipes produtivas
A razão de pessoas formarem organizações reside no fato de que este é o meio que lhes garante a realização de projetos e o alcance de alvos que, individualmente, não conseguem.Portanto, a formação e manutenção de equipes melhora a produtividade sem a necessidade de aumentar o orçamento.
“O objetivo ou a missão do grupo é o fator mais importante na criação e manutenção de uma equipe produtiva”. [13] A probabilidade do risco de surgirem fatores que geram conflitos e necessidades não supridas é bem menor quando os membros de uma equipe têm participação direta no estabelecimento ou aperfeiçoamento do objetivo geral. O administrador inteligente haverá de fazer todo o possível para que os componentes de sua equipe de trabalho tenha participação direta na elaboração do objetivo.

5.       As relações de trabalho
As Escrituras nos apontam dois níveis de relações que todo indivíduo deve ter: a relação com Deus e a relação com o próximo. No que diz respeito ao relacionamento interpessoal, em Sl 133.1, lemos: “Oh! Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos!” Corroborando com o salmista, Paulo disse: “Irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo suplico a todos vocês que concordem uns com os outros no que falam, para que não haja divisões entre vocês, e, sim, que todos estejam unidos num só pensamento e num só parecer” (1Co 1.10).

O relacionamento humano, segundo as Escrituras, é regido pelos seguintes princípios:
a)       Todo relacionamento gira em torno de necessidades pessoais que só podem ser supridas por outras pessoas.
b)       As necessidades supridas solidificam as relações.
c)       Necessidades não supridas desgastam as relações.

A preservação do espírito de cooperação (operar com) depende da aplicação das seguintes regras:
a)       Atacar o problema, não as pessoas. Quando as pessoas deixam de atender as nossas necessidades, nossa tendência é ataca-las em vez de tratarmos o problema.
b)       Falar abertamente o que sentimos em vez de tentar demonstrá-lo pelo comportamento. A tentativa de expressar com atitudes o que sentimos pode gerar mal-entendidos, causar rancor e mágoas.
c)        Perdoar em vez de julgar.
d)       Comprometer-se a dar mais do que receber.






[1] Myron Rush. Administração: uma abordagem bíblica. Belo Horizonte: Editora Betânia, 2005.
[2] Myron Rush. Op. Cit., p. 13.
[3] Myron Rush. Ibidem, p. 15.
[4] Myron Rush. Op. Cit. p. 20.
[5] Myron Rush. Ibidem, p. 20, 21.
[6] GABY, Eliel; GABY, Wagner. Planejamento e gestão eclesiástica. Rio de Janeiro: CPAD, 2012, p. 25.
[7] GABY, Eliel; GABY, Wagner. Op. Cit., p. 26.
[8] Myron Rush. Ibidem, p. 21.
[9] Myron Rush. Ibidem, p. 21.
[10] MYRON RUSH, Op. Cit. p. 22.
[11] MYRON RUSH, Op. Cit. p. 35.
[12] MYRON RUSH, op. Cit. p. 65.
[13] MYRON RUSH, Ibidem, p. 60.

Nenhum comentário:

Postar um comentário